terça-feira, outubro 8, 2024
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Reportagem mostra extensão do poder de Ali Kamel no jornalismo da Globo

Num mundo em que a comunicação está mais ramificada do que nunca, com fontes de informação, confiáveis ou não, brotando de todos os lados, o jornalismo da TV Globo segue como o de maior alcance no país. O “Jornal Nacional”, lançado em setembro de 1969, há quase 55 anos, continua imbatível como o principal jornalístico da TV.

É natural, por isso, que interesse tanto entender como é feito esse jornalismo, avaliar qual é o seu poder, de fato, e verificar de que forma ele se tornou capaz de interferir na vida política do Brasil.

A falta de transparência sobre os meandros da sua produção sempre alimentou as mais variadas teorias sobre tentativas de manipulação da realidade, algumas delas confirmadas com o tempo.


Acredito que a intenção da extensa reportagem de Ana Clara Costa na revista Piauí deste mês seja justamente jogar alguma luz sobre esse universo. O texto busca retratar o impacto da gestão, ou “reinado”, como diz a autora, do executivo Ali Kamel no jornalismo da Globo. Ele trabalhou na emissora por 22 anos, a partir de 2001, até deixar o canal, por vontade própria, no final de 2023.

Durante metade desse período, Kamel foi subordinado de Carlos Henrique Schroder, só assumindo o comando do jornalismo no final de 2012, quando o chefe foi promovido a diretor-geral da Globo. A reportagem rebaixa Schroder, tratando-o como um técnico, “um cara de tecnologia da televisão”, sem maior interesse pelo conteúdo editorial do jornalismo.

“Ambos operavam com uma racionalidade florentina, quase maquiavélica, mas tinham objetivos distintos”, escreve a jornalista. Kamel “não tinha pretensões além de comandar o jornalismo”, enquanto Schroder “desejava um caminho ao topo”.

Com Kamel no comando, a interferência no texto dos jornalistas da Globo se generalizou, escreve Ana Clara Costa. “Era um controle inédito. Para alguns, um insulto”.


Kamel saiu-se muito bem, indica a reportagem, na tarefa de colocar em prática a visão política e econômica da família Marinho. Para isso, “valia-se de uma hierarquia rígida dentro da Globo, em que não há muito espaço para contestação”. Por conta dessa postura dominadora, “nas fofocas de bastidor era impiedosamente chamado de ‘cardeal Richelieu’, o conselheiro despótico de Luís 13”.

A reportagem da Piauí traz um depoimento de Daniel Castro, colunista de televisão da Folha na década de 2000, que revela o esforço de Kamel para influenciar também o conteúdo do que outros veículos publicavam sobre a Globo. Posso corroborar esse depoimento. Quase sempre que me escrevia, muito cordialmente, comentando uma coluna, o executivo também enviava mensagens à Direção do jornal. Registre-se que nunca houve qualquer interferência da Folha no meu texto.

A Piauí faz uma longa descrição das relações da Globo com diferentes governos, do primeiro Lula a Bolsonaro. Vale muito a leitura. Kamel, segundo o relato de FHC em seus “Diários da Presidência”, deu palpites para ajudar José Serra na eleição presidencial de 2002.

Silvia Faria, número dois do jornalismo da Globo à época da Presidência de Dilma, nega na reportagem que a emissora tenha instrumentalizado o noticiário sobre as manifestações de 2013 para enfraquecer o governo. O problema era outro, diz ela. “(Dilma) mantinha aquelas crenças da esquerda de intervenção do Estado”.

Hoje Kamel está na coordenação do Conselho Editorial do Grupo Globo, que dá o norte da cobertura jornalística dos assuntos mais importantes em todos os veículos da empresa. Foi o conselho que decidiu tratar como “terroristas” os participantes do 8 de Janeiro e, mais recentemente, pediu moderação na cobertura dos primeiros passos do novo presidente da Argentina.


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