domingo, outubro 6, 2024
Noticias

Poderia ser filme de suspense, mas é Venezuela

A história daria um bom enredo de uma novela de gangsters, envolvendo corrupção, política, aviões carregados de lingotes de ouro, vidas luxuosas em várias capitais do planeta e falsas narrativas revolucionárias.

Na verdade, porém, é um caso real que apenas aprofundou as crises humanitária, econômica e democrática da Venezuela. A trama gira em torno da sombria figura de Alex Saab, um colombiano adotado pela ditadura venezuelana que acabou virando um agente duplo, a serviço tanto de Nicolás Maduro como da Casa Branca.

Toda a intrincada trama está contada no documentário “A Dangerous Assignment” (uma pauta perigosa), produzido pelo site independente venezuelano Armando.info em aliança com o Frontline, um dos programas de documentários mais importantes dos EUA, transmitido pela cadeia PBS na última semana (ainda indisponível no Brasil). A reação do regime foi imediata, abrindo novas investigações contra os jornalistas envolvidos.

O filme acompanha o repórter investigativo Roberto Deniz, que decidiu, a princípio, investigar por que o leite que vinha nas famosas “bolsas CLAP” (espécie de cestas básicas distribuídas pelo regime chavista para amenizar o desabastecimento) estava causando diarreias e outras doenças em quem o consumia.

Levado a laboratórios credenciados, descobriu-se que o tal leite era composto, basicamente, por farinha, pouco cálcio e muito sódio, e que não poderia nem sequer ser categorizado como tal.

Seguindo a pista do leite falso por vários anos, Deniz termina por descobrir como operava a corrupção chavista, que envolvia superfaturamento na compra desses alimentos de má qualidade, desvio de divisas e lavagem de dinheiro que favorecia a cúpula do regime e um esquema ilegal de intercâmbio de lingotes de ouro e combustível entre a Venezuela e o Irã.

A peça central de todas essas operações era Saab, que começou a ser investigado pela Justiça dos EUA ao movimentar, de modo suspeito, uma imensa quantidade de dinheiro entre contas de diferentes países.

Saab foi preso quando seu voo com destino a Teerã foi interceptado em Cabo Verde, em 2020. No ano seguinte, foi extraditado aos EUA para ser julgado por corrupção e pela lavagem de pelo menos US$ 350 milhões. Em sua primeira audiência, porém, veio à tona outra trama misteriosa: além de ser uma peça-chave no enriquecimento ilícito dos chefes do chavismo, Saab também era um colaborador da DEA, a agência antidrogas dos EUA.

A gestão de Joe Biden, em 2023, acabou fechando uma negociação com o ditador Maduro. Saab seria devolvido à Venezuela em troca da liberação de presos políticos americanos em solo venezuelano e da garantia de que, em 2024, o regime realizasse eleições livres para a sucessão presidencial.

Maduro, por enquanto, só cumpriu a primeira parte desse acordo. O suficiente para que Saab retornasse a Caracas. Nas semanas que se seguiram, apertou a repressão contra opositores e jornalistas, reforçou a inabilitação de María Corina Machado e tem dado cada vez mais sinais de que a eleição não será competitiva.

Na semana passada, por exemplo, o regime insinuou que não aceitaria os observadores internacionais da União Europeia no pleito.

Enquanto Saab está livre e de volta à sua casa, o jornalista Roberto Deniz e tantos outros colegas continuam exilados no exterior. Será que o crime compensa mesmo?


LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

source

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

WP Twitter Auto Publish Powered By : XYZScripts.com