segunda-feira, outubro 7, 2024
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Atentado a Trump mostra que somos bons em produzir violência e ruins em atacar suas causas

Ato contínuo ao lamentável atentado a Donald Trump, o presidente Biden vem a público e diz: “Nós não podemos ser assim”, filosofando em cima do caos em que ele é o ator principal, como se nada tivesse a ver com isso.

Como não podemos ser assim?

Como se a realidade violenta em que eles vivem, em que nós vivemos, surgisse do nada e nada tem a ver com suas práticas. Logo um presidente que, em todas as oportunidades que teve, optou pela violência.

Biden acaba de fazer um discurso nos 75 anos da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) ratificando, em síntese, que apoiará toda e qualquer guerra em defesa dos interesses do ocidente. Reitera a guerra e é aplaudido de pé por seus pares. Jamais fala em usar o poder de convocação e convencimento de seu país, a maior potência do mundo, para promover a paz. E, quando surgem propostas de cessar fogo na ONU, como no caso do massacre que o governo de extrema direita de Israel promove contra o povo palestino, os EUA vetam.

Mas o que era de se esperar que ocorresse em um país que passa inúmeras mensagens de violência: apoia guerras e líderes insanos; trata imigrantes como se animais fossem; é violento e racista com a população negra; tem 700 tiroteios em massa por ano, quase dois por dia, em escolas e espaços públicos. E, mesmo assim, permite a aquisição de armas pela população. E o presidente ainda diz não entender a violência que emana da sociedade e não percebe que o exemplo deve vir do Estado. Não raro, a violência da sociedade é uma resposta à violência do Estado.

Trump, por sua vez, sempre incentivou o uso de armas e os grupos armados, e agora quase tornou-se vítima das políticas que defende. Nem assim mudará, porque sua ideologia e compromissos com setores econômicos não permitem. Seguirá mentindo e manipulando informações em busca do poder, defendendo seus interesses e dos grupos que o apoiam e fortalecendo a Suprema Corte com membros que o protejam, como na inconcebível recente decisão que o isentou mesmo depois de ser julgado culpado pela justiça. Isto não é uma violência?

Elon Musk estimula a violência ao permitir que no seu X os estimuladores de atentados tenham total liberdade de atuação. E faz forte pressão contra qualquer forma de regulamentação das redes sociais e fake news.

Bolsonaro sempre incentivou a violência: desde sua marca registrada, com os dedos das mãos simulando uma arma, a facilitação e flexibilização da compra de armas, até dizer que a solução era matar seus opositores. Entre tantas outras violências provocadas pela política do ódio.

Diante disso, a sociedade habituou-se a essas excrescências, como se fossem normais. E não sabemos solucionar o problema de que a velocidade de criação de políticas reguladoras é muito mais lenta do que a que produz a violência.

No Brasil banalizamos a violência. Afinal de contas morrem 40 mil brasileiros por ano por homicídio. Somos dos países mais violentos do mundo. Entre as dez maiores economias, não há nenhuma tão violenta como a brasileira. É uma das respostas a um Estado que foi capaz de produzir riqueza, mas incapaz de distribuí-la. Somos um dos dez países mais desiguais do mundo. Recentemente soubemos que mais de R$ 600 bilhões por ano vão para isenções e benefícios de um pequeno número de grandes empresas, valor 3,5 vezes maior do que o destinado ao programa Bolsa Família, que alcança em torno de 20 milhões de pessoas.

Como se não bastasse, há poucos dias o Congresso aprovou legislação beneficiando setores da economia como o agro, armas e carne, que depois de um poderoso lobby ficaram fora da cobrança de alíquotas de impostos que poderiam ser destinados à redução das desigualdades sociais e da pobreza.

A injustiça tributária segue vencendo e a justiça social, perdendo. Além disso, setores como o Judiciário, militar e político têm vergonhosos privilégios que outros não têm. Isso tudo não é uma violência? Que retorno esperar depois de décadas destas práticas que atravessam o país, os estados e as cidades?

Vivemos, portanto, produzindo violência e, enquanto não enfrentarmos suas causas estruturais, presidentes atônitos seguirão se comportando como se não tivessem nada a ver com isso.

É momento de pensarmos nos valores que estruturam a sociedade. Se seguirmos baseados no individualismo e na ganância, na falta de solidariedade e empatia, na injustiça social e tributária, e na falta de perspectiva para os jovens, não haverá saída.

Vivemos um momento complexo, injusto e violento. Obra nossa. Que podemos mudar, sim, mas convenhamos: as elites políticas e econômicas não caminham nessa direção. Em um próximo episódio de violência repetirão, com os olhos marejados, algo como o refrão de Biden: “Não podemos seguir assim”. Para logo a seguir retomar a roda-viva, como se não tivessem nada a ver com isso.


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