segunda-feira, outubro 7, 2024
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Malasartes, livraria infantil mais antiga do Brasil, fecha as portas no Rio de Janeiro

Um capítulo da história do livro infantojuvenil brasileiro e do próprio mercado editorial do país será encerrado na próxima semana. A Malasartes, mais antiga livraria infantil em funcionamento no Brasil, irá fechar as portas na quarta-feira, dia 31, no Rio de Janeiro.

Aberta desde 1979 no shopping da Gávea, a loja reúne há 45 anos gerações de escritores, ilustradores e crianças num espaço recheado de mesinhas baixas, estantes coloridas e curadoria afiada de títulos.

“Nós pavimentamos o caminho de ter um espaço lúdico, com almofadas, cores alegres, máquinas de escrever à disposição das crianças. E principalmente com uma curadoria atenta, que se recusava a trabalhar com bobagens descartáveis”, afirma a escritora Ana Maria Machado, uma das fundadoras do espaço. “Nunca dividimos as estantes por faixa etária, por exemplo, por não acreditar que crianças de uma mesma idade sejam iguais.”

A Malasartes nasceu de uma parceria entre Machado, que ainda trabalhava como jornalista naquela época, e a contadora de histórias Maria Eugênia da Silveira. Em seguida, a psicóloga Renata Moraes se juntou à dupla. Mais tarde, após a saída de Silveira, entraram na sociedade a irmã e a mãe de Renata, Claudia Amorim e Yacy Mattos de Moraes, respectivamente.

O batismo veio pouco depois da inauguração. Naquele mesmo ano de 1979, a livraria foi o local escolhido por Chico Buarque para lançar “Chapeuzinho Amarelo”, seu primeiro livro para crianças. A sessão de autógrafos durou horas, com filas pelos corredores e congestionamento nas ruas, colocando a Malasartes no mapa cultural carioca.

“O lançamento do Chico foi muito importante, porque teve uma cobertura tremenda da mídia e foi logo no nosso começo”, relembra Machado. “Mas os moradores da Gávea já tinham descoberto a loja. O shopping tinha três teatros, todos com peças infantis em cartaz, e nós ficávamos na porta anunciando a livraria.”

Autora de clássicos como “Bisa Bia, Bisa Bel”, integrante da Academia Brasileira de Letras e vencedora do prêmio Hans Christian Andersen, considerado o Nobel da literatura infantojuvenil, Machado foi sócia da Malasartes até 1997. Depois, o espaço ficou com Renata Moraes, Claudia Amorim e Yacy Mattos de Moraes, que morreu em 2018. Atualmente, apenas Renata segue na loja.

Curiosamente, o local foi inaugurado simultaneamente a outra histórica livraria especializada em livros infantis —a Miguilim, fundada por Maria Antonieta Antunes Cunha em Belo Horizonte.

“A Miguilim e a Malasartes foram inauguradas no mesmo dia e no mesmo ano, em setembro de 1979. Pura coincidência, não teve nada combinado, ninguém se conhecia nem nada”, conta o escritor Leo Cunha, filho de Maria Antonieta. “Elas puxaram esse movimento. Em São Paulo, por exemplo, ainda não tinha livraria para a infância naquela época.”

Um ano após a inauguração, a Miguilim passou a ser também editora, deixando tempos depois de funcionar como livraria. A criadora do espaço fez parte da equipe da casa editorial até o início dos anos 1990. Hoje, aos 85 anos, ela é membro da Academia Mineira de Letras.

Já a Malasartes não sobreviveu à crise que afeta livrarias físicas pelo país, agravada com a pandemia. Segundo a empresa, as vendas chegaram a cair 70% durante o isolamento causado pela Covid-19. A concorrência com plataformas online e os alto valores pagos pelo ponto dentro do shopping acabaram inviabilizando o negócio.

Vale lembrar que a venda de livros como um todo diminuiu 8% no Brasil em 2023, com um faturamento 5% menor para as editoras, de acordo com uma pesquisa feita pela Nielsen em parceria com a Câmara Brasileira do Livro e o Sindicato Nacional dos Editores.

A partir do dia 31, quando a Malasartes fechar as portas, outras livrarias infantis serão responsáveis por continuar o seu legado. É o caso da Pequeno Benjamim, no Rio de Janeiro. Em São Paulo, da NoveSete, da PanaPaná e da Companhia Ilimitada, por exemplo, além de endereços mais recentes, como a Miúda, a Pé de Livro e A Banca de Livros, entre outros.

“Creio ser perfeitamente possível haver livrarias infantis de qualidade resistindo no Brasil. E há. Confio nelas”, diz Ana Maria Machado.


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