sábado, outubro 5, 2024
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Seres de luz

“Carol Anne, venha para a luz! Venha para a ‘luuuz’, Carol Anne!” Não, “peraí”, pausa nesse “Poltergeist” de filme de terror. Que raio de luz é essa que cismam de deixar acesa quando a vida está se apagando? É branca? Daquelas que amam ter em casa porque “clareiam melhor” e “deixam o ambiente mais calmo”? Já fiquei nervosa.

Seja o que for que nos aguarde do outro lado da existência doméstica, carrego comigo uma fé inabalável: sala de estar com cara de necrotério é pecado. Sendo assim, também não acredito em luz de teto, com sua “acachapância” brutal que dedura nódoas no sofá e falhas no reboco, além de avivar olheiras das visitas e delatar calvícies que sonhavam passar despercebidas.

Feito mariposa atraída por fachos de LED, sempre rondei becos sombrios da cidade e da internet em busca de abajures ou qualquer outra ideia tão luminosa quanto indireta. Mal sabia eu que o caminho rumo à iluminação espiritual passaria pela fulgurante, mas até então obscura para mim, Zezé Lustres.

Já na entrada do centenário sobrado, duas brilhantes ironias. Cochilando na seção de fios e bocais, um gato chamado Batman, o Cavaleiro das Trevas. E por trás do balcão, com cara de poucas brincadeiras, o sisudo seu José —cujo apelidinho íntimo e divertido, sabe-se lá por quê, alguém num breve lampejo de fanfarronice achou de bom tom batizar a loja.

Por todos os lados, uma infinidade de cúpulas de tecido, de plástico e de sonho, em cores que representavam o espectro. Plafons antigos de vidro, estilo bico de jaca, desciam num tutti-frutti adoravelmente demodé, feito um cacho de uvas. Enquanto atendentes jogavam tubos queimados numa caçamba de reciclagem, feito “jedis” que não sucumbiram ao lado fluorescente da força.

“Em que posso ajudá-la?”, perguntou-me o seríssimo Aladim cármico. Saquei do celular uma humilde listinha. Coisa pouca, solicitada pelo “Em que posso ajudá-la?”, perguntou-me o seriíssimo Aladim cármico. Saquei do celular uma humilde listinha. Coisa pouca, solicitada pelo eletricista. No entanto, meu desejo maior era dizer —sem titubear ou bruxulear— que ele me ajudaria muito mais abrindo outras portinhas como aquela por aí. No entanto, meu desejo maior era dizer – sem titubear ou bruxulear – que ele me ajudaria muito mais abrindo outras portinhas como aquela por aí.

Ao fechar a conta, eu me lembrei de um lustre que andava às escuras e adicionei um item. Quiçá confiando em minhas lamparinas do juízo, quiçá apenas validando o jocoso apelido, Zezé deu um sorriso de canto de boca e me entregou uma lâmpada amarela. Da mesma temperatura do meu coraçãozinho.

Aos seres de luz que discordarem, um último pedido. Antes de irmos todos embora junto com Carol Anne, desliguem o tal do interruptor. Ninguém aqui é sócio da companhia elétrica.


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