Alexandria queimada novamente
Queimaram! Queimaram Alexandria. Ligaram-me às 3 horas da manhã de uma quinta-feira.
— Queimaram Alexandria!
— Como assim? A gente tá em 2024. Quem é?
A ligação caiu. Voltei a dormir inquieto, completamente assustado com o telefonema. Quem era? Do que estava falando? Onde conseguiram meu número? Inundado por questionamentos, acordei atrasado para ir trabalhar. Estava cansado, refletia freneticamente sobre o ocorrido da madrugada. Tomei meu café e segui o caminho de sempre.
“Queimaram Alexandria!”, ouvia as pessoas sussurrando em tom melancólico e apavorado. Ainda sem entender, caminhei até a empresa que ficava bem perto da minha casa.
Nas ruas, faixas de luto e gente chorando. O caos estava instaurado na cidade, meu celular estava descarregado e não tinha ninguém para explicar o que havia de fato acontecido. Comecei a ficar atordoado, crescia o medo de algum desastre ter assolado a cidade, ou o anúncio de um furacão chegando, a comprovação de óvnis e ETs, a volta de Jesus Cristo. Meu Deus! Tantas possibilidades.
Será que morreríamos todos? Será que existia outra biblioteca gigante intitulada também Alexandria, uma Alexandria 2.0 atualizada e com mais informações da qual eu não tinha conhecimento?
Comecei a questionar a minha própria sanidade, ou pior, a minha inteligência. Onde eu estava esse tempo todo que não ouvi falar da majestosa nova Alexandria? Seria possível uma pessoa ser tão desligada? Se existia mesmo, onde ficava?
Eu estava apavorado, tomado pelo sentimento de desordem. Entrei na empresa, subi o elevador, clima fúnebre no ambiente. Fui direto tomar um café, precisava com urgência distrair a cabeça. Na copa, dois colegas conversavam. Achei então minha deixa para descobrir finalmente o que tinha acontecido.
— Bom dia, meus caros. Vocês sabem me dizer o que aconteceu? Que Alexandria é essa que queimou?
— Você não soube? Derrubaram o acervo no Drive.
O “acervo do Drive” era o maior site fornecedor de filmes gratuitos da internet. Todos os dias, links e mais links de filmes velhos, filmes novos, filmes que mal tinham sido lançado. Eu pude então compreender. Queimaram a nossa Alexandria e eu passei a semana inteira desolado.
Rayane Petek é jornalista em formação. Ama arte e literatura.
O blog Praça do Leitor é espaço colaborativo em que leitores do jornal podem publicar suas próprias produções. Para submeter materiais, envie uma mensagem para leitor@grupofolha.com.br
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