domingo, outubro 6, 2024
Noticias

Migrantes em Cumbica: entre o Estado, as aéreas e a concessionária

A problemática da inadmissão de migrantes no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, é denunciada por ativistas de direitos humanos no Brasil ao longo dos últimos 20 anos. Chama a atenção a recente decisão do Ministério da Justiça e Segurança Pública de restringir a entrada de migrantes. O passageiro em trânsito que não tiver visto de entrada no Brasil e tem como destino final outro país terá que seguir viagem ou retornar ao local de origem.

Se um dos pontos nevrálgicos das migrações no Brasil é o estado de Roraima, com a presença dos venezuelanos, hoje o aeroporto também é o termômetro para se avaliar a política migratória nacional —considerando também a situação dos afegãos, que, após passarem pelo controle migratório, alguns ficam nos mezaninos do complexo aeroportuário.

Vale lembrar que no longínquo ano de 2013 um cubano ficou retido por cinco meses na área de inadmitidos, conhecida como a sala do conector de um dos maiores aeroportos do mundo, uma das maiores fronteiras brasileiras. Nos últimos dias, mais de 500 pessoas estavam na área restrita, entre os quais o sr. Evans Osei Wusu, 39 anos, africano da República de Gana que faleceu ao passar mal, evidenciando a necropolítica das fronteiras.

Longe do glamour do free shop e das salas vips, o espaço dos inadmitidos também se constitui nas áreas inferiores de embarque/desembarque do Terminal 3, construído para ampliar as operações comerciais dado o volume de turistas que vieram à Copa do Mundo de de 2014. Em grande parte, os inadmitidos são pessoas oriundas do Sul Global: África e Ásia, pessoas não brancas que vivenciam o racismo e a xenofobia nos espaços de exceção.

Os migrantes inadmitidos ficam entre o controle migratório dos agentes de fronteira do Estado brasileiro; as companhias aéreas, que são responsáveis por prover alimentação e os custos com os voos de retorno; as pessoas são colocadas em situações de vulnerabilidade num espaço físico com estrutura precária e permanecem durante dias, local que é de responsabilidade da empresa concessionária que administra o aeroporto. Os migrantes, em especial os solicitantes de refúgio, esperam a decisão da autoridade migratória para sair do espaço. No entanto, com a nova posição, coloca-se em alerta o princípio da não devolução. Cria-se um limbo jurídico entre os desejáveis e os indesejáveis.

Mesmo com o termo de cooperação técnico-institucional que desde 2015 situa um fluxo de atendimento, faz-se necessária uma melhor implementação. A sociedade civil, os órgãos de Estado que fiscalizam o Poder Executivo e os organismos internacionais cumprem um papel de suma importância para apontar as responsabilidades e os retrocessos institucionais.

É imprescindível ampliar mecanismos de controle social e transparência em relação ao Estado brasileiro e demais envolvidos nas inúmeras situações ocorridas, de forma que não haja violações de direitos e arbitrariedades —sobretudo com os que almejam o refúgio e desejam recomeçar suas vidas no Brasil.

TENDÊNCIAS / DEBATES

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

source

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

WP Twitter Auto Publish Powered By : XYZScripts.com