domingo, outubro 6, 2024
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Precisamos falar da qualidade do Cadastro Único

É indiscutível que o Cadastro Único é o maior e único instrumento para concessão de benefícios socioassistenciais. Foi um dos principais responsáveis pela redução de pobreza do Brasil, internacionalmente reconhecida no passado e no presente.

Seus méritos, no entanto, não podem servir de blindagem para a discussão de seus problemas, em especial, considerando que agora o cadastro é também responsável pela concessão de uma nova lista de benefícios para além do Bolsa Família.

Partem do cadastro o Pé-de-Meia, a faixa 1 do Minha Casa Minha Vida, a tarifa social do saneamento, a da energia elétrica, as cisternas, o cashback, o auxílio gás, entre outros.

A melhor forma de avaliar a qualidade das informações do cadastro é realizar uma pesquisa isenta e de dupla checagem de uma amostra mínima de cadastrados. No passado, já tivemos pesquisas desse formato para tal finalidade. No presente, dada a magnitude de benefícios que temos, valeria a pena realizá-la.

Uma alternativa à dupla checagem, com diversas limitações, é mimetizar e tentar simular os conceitos de universo, família e renda do Cadastro Único e contrastá-los com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Nada garante que o cadastro de 2023 meça o mesmo que a Pnad de 2022, e toda a aproximação de informações e conceitos diferentes tem limitações.

Um estudo do Insper lançado em março, realizado a partir de uma sugestão do ministro do Desenvolvimento Wellington Dias, propõe uma forma de compatibilização de conceitos e contrasta ambas as pesquisas.

O estudo encontrou 22,3 milhões de famílias vulneráveis no Cadastro Único de 2023 e 15,8 milhões de famílias na Pnad Contínua de 2022: uma diferença de 29% a mais no cadastro. Considerando as limitações, o número poderia indicar um problema de qualidade do Cadastro Único?

Alguns entendem que não, pois as fontes medem a pobreza de forma distinta. Na Pnad Contínua, a pobreza é medida de forma estática em quatro momentos de um mesmo ano; no CadÚnico, é medida de forma dinâmica. Como é sabido, a volatilidade da renda faz com que as famílias entrem e saiam da pobreza frequentemente e, conforme estudo do Ipea do mês passado, a pobreza dinâmica é maior do que a estática.

Mas essa explicação não parece dar conta do aumento da diferença entre as duas fontes ao longo do tempo ou mesmo da diferença entre estados.

Em 2017, a diferença era de 10% a mais no cadastro, em 2022, de 36% a mais, e em 2023, de 29%. Nesse período, a pobreza caiu e a economia melhorou. Não temos evidências que sustentem um aumento dessa magnitude ao longo do tempo da pobreza dinâmica.

Além disso, o estudo demonstrou que a heterogeneidade é enorme entre os estados e ao longo do tempo: Rondônia, Roraima e Santa Catarina têm quantidades nas duas bases muito similares na comparação, enquanto Rio de Janeiro, Amapá e Piauí apresentam o dobro de famílias vulneráveis em relação à Pnad.

Se o cadastro tem um bom registro, que é capaz de ordenar as famílias em termos de pobreza, a diferença entre as duas fontes seriam iguais em todos os territórios. No entanto, há diferenças entre estados. Se o cadastro tem a mesma qualidade em todos os lugares, a diferença deveria ser igual no mapa e ao longo dos anos.

Urge retomarmos uma dupla checagem amostral com a finalidade de avaliar a qualidade do CadÚnico. Precisamos aprimorar sua gestão para tornar esse instrumento mais eficiente e eficaz para a redução da pobreza e a diminuição das desigualdades, como foi no passado.


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