domingo, outubro 6, 2024
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Como fazer a política industrial europeia funcionar

“A principal razão pela qual a produtividade da União Europeia (UE) divergiu dos Estados Unidos em meados da década de 1990 foi o fracasso da Europa em capitalizar a primeira revolução digital liderada pela internet —tanto em termos de geração de novas empresas de tecnologia quanto na difusão da tecnologia digital na economia. Na verdade, se excluirmos o setor de tecnologia, o crescimento da produtividade da UE nos últimos 20 anos estaria amplamente em paridade com os EUA.”

Este trecho do relatório de Mario Draghi sobre a competitividade europeia aponta para uma parte central da agenda para o futuro da UE.

Por mais vital que seja, este é apenas um dos desafios econômicos estratégicos que a UE enfrenta. Outros incluem a vulnerabilidade energética, a transição verde e o aumento do protecionismo. Draghi fornece tanto um quadro quanto sugestões sobre como responder aos problemas. Isso incluirá políticas comerciais e industriais mais intervencionistas. O desafio é fazer com que essas políticas sejam direcionadas e sensatas.

Nas indústrias de defesa, por exemplo, seguir o exemplo da Airbus parece bom. Comparado com os EUA, o setor de defesa europeu é muito fragmentado. Fusões transfronteiriças parecem ser essenciais.

Problemas semelhantes existem nos setores bancário, de mercados de capitais e de fornecimento de energia. Por várias razões, os governos estão se recusando a permitir a integração transfronteiriça tão necessária. Isso reflete a política nacionalista e os interesses especiais.

Como resultado, barreiras regulatórias persistem. Felizmente, a história da UE mostra que tais obstáculos podem ser superados com vontade política. Mas será que essa vontade algum dia se concretizará?

A mudança para “tecnologia limpa” nos setores automotivo e de energia é um desafio mais complexo. Como observa o relatório Draghi: “Devido ao rápido ritmo de inovação, baixos custos de fabricação e subsídios estatais quatro vezes maiores do que em outras grandes economias, [a China] está agora dominando as exportações globais de tecnologias limpas.”

Isso cria tanto oportunidades para a adoção acelerada de novas tecnologias quanto uma disrupção para importantes indústrias da UE e a possibilidade de serem excluídas de partes da cadeia de suprimentos, como baterias, por falta de acesso a matérias-primas críticas. No geral, a intervenção é inevitável. A lei comercial também permite isso. Intervir de forma eficaz é outra questão. Mas, feito com cuidado, deve ser possível.

A revolução digital é outra questão. Seria ridículo imaginar que investir em versões “campeãs da UE” do Google, Microsoft, Apple ou Nvidia funcionaria. Medidas comerciais comuns também não ajudariam: como se poderia dificultar as buscas no Google sem introduzir restrições ao estilo chinês?

Também não parece plausível que faltem fundos para oportunidades tecnológicas atraentes, embora a reforma dos mercados de capitais deva ajudar a construir uma indústria de capital de risco maior na UE. Mas o fato de que o investimento em capital de risco na UE foi apenas um quinto do que foi nos EUA em 2023 não se deve à falta de poupança na UE. Deve-se à falha em criar o ecossistema tecnológico necessário.

Então, por que isso aconteceu? Não é que a UE careça de pessoas. Comentadores informados argumentam que isso se deve em grande parte ao excesso de regulamentação. Dois tipos de regulamentação são cruciais: a do setor de tecnologia especificamente e a mais ampla da economia, especialmente do mercado de trabalho, que afeta particularmente novos empreendimentos imprevisíveis. Se você não pode demitir, não contratará e, portanto, irá para outro lugar.

O especialista em tecnologia Andrew McAfee, do MIT, fez uma crítica contundente à política da UE. Ele concorda que o estado da indústria tecnológica é terrível. Mas o problema não é a falta de dinheiro: os governos da UE gastam praticamente a mesma quantia (e parcela do PIB) em apoio à pesquisa e desenvolvimento que o governo federal dos EUA.

Sim, o primeiro está fragmentado entre os estados membros. Mas esse não é o principal problema, ele argumenta: “É a intervenção governamental nesse ecossistema não com financiamento, mas com leis e regulamentações, e outras restrições, limitações e encargos sobre as empresas.”

O analista de políticas tecnológicas Adam Thierer elabora: “Vários estudos recentes documentaram os custos associados ao GDPR [Regulamento Geral de Proteção de Dados] e à abordagem pesada da UE em relação aos fluxos de dados de forma mais geral.”

Isso impõe custos elevados às empresas inovadoras e, inevitavelmente, quanto menor a empresa, maior o imposto implícito. Dado isso, bem como os mercados fragmentados da UE, não é de se admirar que os EUA estejam tão à frente.

Um artigo de Oliver Coste e Yann Coatanlem, publicado pela Universidade Bocconi em Milão, faz outro ponto importante e ainda mais amplo sobre regulamentação: novas e dinâmicas empresas precisam ser capazes de ajustar seus custos rapidamente à luz dos desenvolvimentos do mercado. Assim, observam os autores, os custos de reestruturação —em grande parte resultantes da regulamentação de proteção ao emprego— são fundamentais.

Quanto mais caro for reestruturar, mais cautelosa será a empresa. Cumulativamente, essas proteções são paralisantes. O governo trabalhista do Reino Unido deve observar esse perigo potencial em seus planos.

Draghi concorda que a regulamentação é uma grande questão. Ele observa que “o ambiente regulatório extenso e rigoroso da UE (exemplificado por políticas baseadas no princípio da precaução) pode, como efeito colateral, restringir a inovação. As empresas da UE enfrentam custos de reestruturação mais altos em comparação com seus pares dos EUA, o que as coloca em uma posição de enorme desvantagem em setores altamente inovadores caracterizados pela dinâmica do vencedor leva a maior parte.”

Ele até recomenda um novo “vice-presidente da comissão para simplificação”. Boa sorte com essa abordagem.

A questão é bastante filosófica e política. A UE precisa encontrar uma maneira de regulamentar o setor de tecnologia que não estrangule simultaneamente seu crescimento. Fazer isso será um grande desafio.


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