domingo, outubro 6, 2024
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Você seria capaz de dar a vida por sua equipe?

Você seria capaz de dar sua vida por algo ou alguém? Quando vai ao jogo de futebol comigo, minha filha canta um verso da uniformizada que diz: “Vamos, Portuguesa/ Sua história é tão bonita/ Por você eu sou capaz/ De dar minha vida”.

Não que Dudu pense nisso –felizmente–, mas é também verdade que ela canta o verso com intensidade e vontade, mesmo em jogos da Copa Paulista. É palpável, há alguma sinceridade em seu canto.

Soa bastante estúpido dar a vida por algo que pode ser apenas uma afinidade eletiva surgida um tanto aleatoriamente. Não se está a lutar por uma causa. Mas alguma causa vale a vida? É possível falar de uma ontologia de causas ótimas para entregar a vida?

Entrariam possivelmente aí valores –justiça vem-me rápido à cabeça–, sociedades, entidades, agrupamentos, clubes, comunidades, pessoas, países.

A “Psicologia das Massas” de Freud é sempre citada quando multidões agem como manada, em comportamentos que podem descambar para a violência. Mas o rebanho necessariamente segue um líder, escreve o pai da psicanálise, e o mimetiza.

Não consigo ver esses messias nas torcidas de futebol. Se agem como manada, parecem fazê-lo de maneira mais horizontal, como que convocadas por uma beligerância ancestral.

Essa conversa me foi inspirada por um contraexemplo: me vi torcendo intensamente pelo sucesso de quatro companheiros que havia recém-conhecido e que disputavam sua primeira corrida de 16K.

Disputar pode ser um verbo um tanto forte, porque terminar a prova 10 Milhas Garoto, com sua impressionante história de três décadas e meia na região metropolitana de Vitória (ES), era uma missão que estranhamente tinha a ver com a natureza do trabalho do quarteto: eles são influenciadores, produtores de conteúdo, e a corrida era o grand finale de uma série de demandas profissionais.

Pois eles completaram a prova, muitos minutos depois de mim e do treinador pioneiro da corrida, Wanderlei Oliveira, hoje também jornalista. Para mim e para WO, a corrida era mais uma.

Nada sugeria um grande congraçamento entre jornalistas e influenciadores durante nossos dias de contato. Deslocávamo-nos, por exemplo, em vans separadas, como a refletir, talvez, a natureza supostamente distinta do trabalho de uns e outros.

Enquanto os primeiros, mesmo a convite de um patrocinador, como era o caso, deveriam exercer algum nível de desconfiança, ter algum decoro, vá lá, jornalístico, aos segundos caberia vestir sem peias a camisa do sponsor.

É mesquinho, creio, ver alguma superioridade aí –valeria morrer por um jornalista e não por um influencer?–, mas ainda mais mesquinho, ignóbil mesmo, seria fechar-se às possibilidades das relações interpessoais.

Mas não foi por voluntarismo ou por exercer valores elevados que senti profundo orgulho da conclusão da prova por Carol, Dudu, Juan e Cauê, até horas antes totais desconhecidos. A coisa veio, como sempre vem, com naturalidade, de maneira quase inconsciente. Resultado de uma humanidade também ancestral, atávica.

Disse mesmo a alguns deles, durante a foto que pedi para tirar, que me sentia como o capitão de uma equipe havia muito formada, a nossa equipe.

Será que damos a vida pela nossa equipe? Seria isso o amor?


O colunista viajou a Vitória (ES) a convite da Nestlé, proprietária da Chocolates Garoto, que desde 1989 realiza a 10 Milhas Garoto. Nesta edição, cerca de 50% dos trabalhadores da fábrica disputaram a prova


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