sábado, outubro 5, 2024
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Usar dinheiro público fora do Orçamento é grave risco

Nunca é bom sinal quando o governo, em vez de propor uma medida com clareza de intenções e argumentos, prefere incluí-la de modo sorrateiro em algum projeto sobre outro tema já em tramitação no Congresso. Pior ainda é quando o dispositivo cria algum mecanismo intrincado para usar dinheiro público fora do Orçamento.

Pois foi o que a administração petista fez ao inserir numa proposta de emenda constitucional, já aprovada pelo Senado, uma norma que permite destinar até 25% do superávit de fundos públicos ao financiamento de projetos ligados a ações ambientais, conforme a Folha noticiou.

Fundos de diferentes propósitos e fontes de receita têm um saldo de R$ 228 bilhões apurado em dezembro de 2023, mas nem todos seriam atingidos pela nova regra. Procurado, o Tesouro Nacional diz que a expectativa é não empregar mais de R$ 20 bilhões ao ano dos recursos.

A PEC, porém, não traz limitações de valores e tampouco especifica quais fundos poderão ser acionados para sustentar os novos financiamentos. A proposta aguarda votação na Câmara dos Deputados e deve ser aprovada por conter medidas já acordadas para beneficiar os prefeitos em ano de eleições municipais.

É inegável que o governo precisará de mais dinheiro para enfrentar o impacto da mudança climática nos próximos anos. Assim o mostram a tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul e a seca que fez proliferar o fogo no cerrado, no pantanal e na amazônia. Esse objetivo, porém, precisa ser orçado com transparência.

Pelo jabuti legislativo de Brasília, excedentes disponíveis nos fundos serão utilizados em operações de crédito, presumivelmente em taxas favorecidas. Nesse caso, haverá subsídio —vale dizer, um gasto público— não explicitado no Orçamento.

Não há dados consolidados recentes sobre o superávit dos fundos. Também não há informações sobre as instituições financeiras aptas a usar esses recursos.

De antemão sabe-se apenas que será beneficiado o Fundo Clima, operado pelo BNDES, o que aumenta a preocupação sobre o alcance da medida —nas administrações petistas anteriores, viu-se uma escalada desastrosa de subsídios concedidos por meio do banco de fomento.

Não é a primeira vez, recorde-se, que este terceiro governo Luiz Inácio Lula da Silva se vale de manobras para criar despesas fora dos limites orçamentários. Um exemplo é o programa de estímulo à permanência de alunos no ensino médio, bancado por um fundo de natureza privada que recebeu aporte do Tesouro Nacional fora das regras fiscais.

Subterfúgios do gênero podem parecer engenhosos à primeira vista, mas a experiência recente mostra seu enorme dano potencial. De pouco adianta cumprir metas de ajuste à custa de exceções e manobras de contabilidade, enquanto a dívida pública —o indicador mais importante— continua em expansão.

editoriais@grupofolha.com.br

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